PM que matou jovem negro em mercado foi reprovado no exame psicológico





São Paulo — O policial militar Vinicius de Lima Britto (foto em destaque), que executou o jovem negro Gabriel Renan da Silva Soares no estacionamento de um mercado na zona sul de São Paulo em 3 de novembro, foi reprovado na primeira vez que prestou o exame psicológico da PM.


Dentre as razões apontadas pela banca examinadora para reprovar Vinicius, está o descontrole emocional apresentado pelo então candidato.


Exame psicológico da PM


O edital Nº DP-1/321/21 para o cargo de Soldado PM de 2ª Classe do Quadro de Praças de Polícia Militar (QPPM) previa as seguintes etapas:



  • Exames de conhecimentos, com prova objetiva e dissertativa, ambas de caráter eliminatório e classificatório;

  • Exames de aptidão física, de caráter eliminatório;

  • Exames de saúde, de caráter eliminatório;

  • Exames psicológicos, de caráter eliminatório;

  • Avaliação da conduta social, da reputação e da idoneidade, de caráter eliminatório;

  • Análise de documentos, também de caráter eliminatório.


Vinicius passou por todas as fases do certame até ser eliminado no exame psicológico. De acordo com o edital, a PM espera admitir candidatos com flexibilidade moderada, disposição para o trabalho, capacidade de liderança, relacionamento interpessoal adequado, inteligência, fluência verbal e resiliência.


Por outro lado, são dispensados candidatos com descontrole emocional, sinais fóbicos e falta de domínio psicomotor.



Vinicius foi considerado inapto por não apresentar relação interpessoal adequada ou capacidade de liderança. Além disso, ele demonstrou ter descontrole emocional.


A banca examinadora indicou que o candidato apresentou “instabilidade nos contratos sociais” e “tendência a atribuir pouca importância aos sentimentos, desconfiança desmedida e insegurança no trato com figuras de autoridade”.


Os examinadores também concluíram que, diante de situações adversas e desafiadoras do dia a dia, Vinicius evidenciava ter “uma personalidade instável e pouco persistente frente às adversidades cotidianas”. Ele também demonstrou ter baixa capacidade crítica e ansiedade na adaptação.


Por fim, a banca considerou que o candidato apresentou ter “traços de emotividade, com presenças de aspectos de impulsividade evidenciando poucos recursos de controle emocional, tendendo a agir fortemente por meio de condutas instáveis e imprevisíveis, com propensão ao desequilíbrio fisiológico e psicológico, podendo agir sem tanta reflexão diante de inesperadas”.


Briga na Justiça


Vinicius chegou a entrar na Justiça em setembro de 2021 com uma liminar pedindo que fosse “readmitido imediatamente no certame”. O objetivo era que ele participasse provisoriamente das demais etapas do concurso público e passasse por um novo exame psicológico, desta vez realizado por um perito judicial.


Como argumento, a defesa do então candidato apontou que as características exigidas para o cargo de Soldado PM de 2ª Classe são de “natureza puramente subjetiva”. Além disso, o advogado representava Vinicius à época, afirmou que “o examinador também pode errar” e que “ao menos uma oportunidade de reavaliação deve ser concedida”.


Segundo a defesa, o autor da ação é “possuidor de boa formação pessoal e moral e considerar-se possuidora de características cognitivas e de personalidade compatíveis com o exercício da função pleiteada”.


O advogado também pediu certa urgência na decisão da Justiça visto que as demais etapas do certame estavam em andamento, o que poderia acarretar “danos irreparáveis para o candidato”.


A defesa apontou ainda que o exame psicológico do concurso dura menos de cinco minutos, tempo que seria insuficiente para análise do perfil do requerente. Segundo o advogado, Vinicius foi avaliado “de forma tão insignificante”.


A juíza Lais Helena Bresser Lang, da 2ª Vara da Fazenda Pública de São Paulo, indeferiu a liminar e extinguiu o processo em agosto de 2022. A magistrada considerou o exame psicológico legítimo, baseado em laudo pericial fundamentado.


Lang também concordou com a conclusão do laudo psicológico, que apontou a ausência de perfil psicológico adequado em Vinicius para o exercício da função de soldado da PM.


Ela apontou ainda que aprovar uma nova avaliação psicológica para o requerente configuraria um tratamento diferenciado em relação aos demais candidatos, violando o princípio da isonomia.


A defesa entrou com novo pedido de apelação em setembro do mesmo ano, o que foi negado de forma unânime pela 2ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), mantendo a decisão de primeira instância. O processo foi arquivado definitivamente em 24 de agosto de 2023.


Vinicius, atualmente soldado da Polícia Militar, responde a um processo no Tribunal de Justiça Militar (TJM) por abuso de autoridade. A ação é de outubro deste ano e corre em segredo.


Execução de jovem negro


Vinicius de Lima Britto executou Gabriel Renan da Silva Soares no estacionamento do mercado Oxxo localizado na Avenida Cupecê, na zona sul de São Paulo, em 3 de novembro de 2024.


Gabriel havia furtado três embalagens de sabão. Ao sair correndo do estabelecimento, o jovem tropeçou em um papelão que estava no chão e foi alvejado com 11 tiros pelo PM, que estava de folga.


No boletim de ocorrência, Vinicius alegou legítima defesa, afirmando que Gabriel teria dito que estava armado. Segundo o PM, o jovem teria colocado a mão na blusa, dando a entender que sacaria um revólver, o que motivou os tiros.


Ao revistar o corpo da vítima, nenhuma arma foi encontrada, mas 11 perfurações por arma de fogo, distribuídas entre o tórax, as mãos, os braços e o rosto do jovem.


Imagens das câmeras de segurança do mercado, divulgadas na última segunda-feira (2/12) pelo tio da vítima, também desmentem a versão do policial militar. No registro, é possível ver que o PM atira pelas costas de Gabriel, que em momento algum havia apresentado resistência ou risco de tentar contra a vida do policial.



Após o caso, Vinicius foi afastado da corporação, informou a Secretaria da Segurança Pública de São Paulo (SSP).


Contatado pelo Metrópoles, o então advogado do PM não quis se manifestar, afirmando apenas que Vinicius foi aprovado em outro concurso e não o representa mais.






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